quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Faltam deveres de casa para o Brasil (Editorial)

Não é desprezível o PIB brasileiro ter ultrapassado o da Inglaterra, com US$ 2,51 trilhões, e o país ser agora a sexta maior economia do mundo. Mas, antes que bravatas nacionalistas prejudiquem a percepção da realidade, cabe relativizar o feito, sem reduzi-lo de importância.
Bem fez o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ao lembrar que, para o brasileiro atingir o padrão de vida inglês, serão necessárias mais uma ou duas décadas de crescimento contínuo. Pois, se a renda per capita brasileira é de US$ 12.916, a inglesa está em quase US$ 40 mil.
Algo semelhante acontece com a China, segunda potência econômica mundial, mas com uma renda per capita de US$ 5.183, menos que a metade da brasileira.
O PIB — o valor de tudo o que é produzido num país — é um indicador relevante, mas apenas um indicador. Para se ter uma ideia abrangente de um país, é necessário reunir uma série de dados. Mais ainda quando se trata do Brasil, terra de grandes disparidades — regionais, de renda, sociais, etc.
Há vários outros índices que mostram como o Brasil ainda precisa avançar. Um deles é o do Desenvolvimento Humano (IDH), bem mais abrangente que o PIB. É sugestivo que a sexta economia tenha apenas o 73 IDH.
A trajetória cumprida pela sociedade depois da redemocratização, em 1985, lançou as bases para o país chegar ao ponto atual. Em 1994, com o Plano Real, veio a estabilização da economia, sem a qual nada seria possível. De 2003 a 2010, Lula resistiu à tentação de "mudar tudo isso que está aí", manteve os conceitos básicos da política econômica anterior e conseguiu combater a miséria — seria impossível se a inflação voltasse.
Atingido o patamar de sexta "potência", o Brasil tem de se lançar sobre uma agenda da qual tenta escapar nos últimos nove anos.
Para repetir em outros índices o crescimento do PIB, com inclusão social, terá de fazer reformas como a da Previdência. Ela é vital a fim de impedir um futuro europeu para aposentados e pensionistas brasileiros, e ainda abrir espaço nas contas públicas com o objetivo de se ampliar os gastos em educação, chave para o crescimento ter sustentabilidade.
E se também aperfeiçoar a arcaica legislação trabalhista, o país ampliará ainda mais a formalização no mercado de trabalho, fonte de financiamento do próprio sistema previdenciário.
Também com o mesmo objetivo de mudar a composição dos gastos públicos, Brasília precisará abrir de fato portas de saída para beneficiários do grande sistema assistencialista montado nos últimos 16 anos. Ele só terá êxito quando liberar pessoas para o mercado de trabalho.
Gastos públicos proporcionalmente menores — um estado do tamanho de 40% do PIB precisa ser menos pantagruélico —, permitirão, ainda, o aumento da taxa de poupança, hoje na faixa dos 20% do PIB, cinco pontos aquém do necessário para a economia se manter em crescimento sem sustos.
Ministra de Lula, Dilma Rousseff viveu parte dessa história por dentro. Deve saber que seria ruinoso repetir a falácia da ditadura militar de tentar crescer com inflação.
Depois do Plano Real, o Brasil precisa de novo salto: crescimento equilibrado, juros "normais", com um sistema educacional de bom padrão, infraestrutura ampliada e modernizada, para o que será necessária uma maior participação privada no setor e, portanto, menos preconceito ideológico em Brasília.
É a missão da atual geração de dirigentes brasileiros.

2 comentários:

  1. Prezado Professor,

    De uma olhada no artigo da EC sobre o tema da

    SEXTA ECONOMIA DO MUNDO!.

    Que potência é essa?

    BRASÍLIA - A grande (e ótima) novidade anunciada durante as minhas férias foi que o Brasil passou o Reino Unido e é agora a sexta economia do mundo. Uau! Somos uma potência! Mas que potência é essa?
    A infraestrutura é sofrível. Os "apaguinhos" são quase rotina, os portos estão cheios de gargalos, as estradas são péssimas, ferrovias praticamente inexistem.

    Chegar de uma viagem internacional é um inferno no Galeão e em Guarulhos, as grandes portas de entrada, e até mesmo em aeroportos menores, como o de Natal, onde há três (isso mesmo: três) esteiras de bagagem até que a ampliação seja concluída.

    Quanto à educação: Será que o país tem boas escolas para a maioria e profissionais de ponta para enfrentar os desafios do crescimento e da competitividade em todos os setores? Há dúvidas.

    E o país consegue ser a sexta economia mundial com um IDH ainda vexaminoso. Quando você passeia pelo interior do Nordeste, onde as coisas vêm melhorando, é verdade, assusta-se com os ainda extensos bolsões de miséria atolados em dois ou três séculos atrás.

    Povoados sem asfalto, um atrás do outro, com crianças barrigudinhas e descalças correndo na poeira, entre mulheres de ar sofrido e pele encarquilhada e homens trôpegos pela cachaça e pelo cansaço de uma vida inteira de trabalho duro, debaixo de sol a pino e em regime de semiescravidão.

    Não consta que haja gente e cenários assim no Reino Unido e na França, o próximo país a ser, bem antes do que se previa, ultrapassado pela economia emergente do Brasil.

    O que está em pauta não é (só) o ritmo da economia e o complexo equilíbrio entre crescimento mais baixo e inflação debochada, mas principalmente a qualidade do desenvolvimento. Há que se discutir por que, para que e para quem o Brasil assume ares de potência.

    Eliane Cantanhêde

    Ótimo 2012!

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  2. Olá! Já havia lido o artigo no jornal. É pertinente. Seria ruim se o Brasil caisse pelas tabelas como europeus estão caindo, mas ainda estamos muito longe de sermos uma real grande potência. Enquanto os recursos para a educação forem pífios, enquanto prevalecer essa enorme desigualdades social, e enquanto o Brasil conrinuar a ser um dos países mais corruptos do mundo, poderá até haver crescimento, mas não necessariamente desenvolvimento. Mas o Mantega já disse que maior qualidade, somente mesmo daqui a uns vinte anos. Tomara. Grato pela participação.

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